sábado, 10 de julho de 2010

O TEXTO "MARACANÃ"

Meus Nobres Leitores,

Com este post dou início a uma nova fase do Blog do Cid, qual seja, vou apresentando os textos e os comentando também, juntamente com a visão holística da minha plêiade de leitores.

Estava em dúvida com que texto iniciaria esta nova fase do Blog do Cid. Mas, assim como que caindo dos céus, veio a natureza e nos presenteou com novo ataque de cianobactérias nas lagoas da Barra da Tijuca. Os ambientalistas capitaneados pelo Moscatelli declaram aos 4 cantos do mundo, que as cianobactérias se proliferam em demasia quando encontram esgoto in-natura (cocô) e alta temperatura.

Entretanto, a Administração Municipal vem a público minimizando o ocorrido e, mais uma vez, põe a culpa nas algas. Pronto, ocorreu o que eu precisava para decidir qual seria o primeiro texto. Maracanã, apesar de ter sido escrito há mais de 10 anos, está atualíssimo.

Resta-me apenas contar como foi gerado este texto, e anexá-lo a este post.

Durante a década de 90, como de hábito, estava eu logo cedo lendo o jornal, quando me deparei com uma notícia bem semelhante à que foi comentada no início deste post, citando que as algas estavam poluindo as águas de nossas praias. De início, não dei muita atenção à notícia, pois águas poluídas não representam novidade na cidade do Rio de Janeiro. Saímos para trabalhar, estando Gabriela dirigindo, Marcelo no banco de trás, e eu ia no banco do carona, distraidamente, observando a beleza da orla de Leblon e Ipanema. Quando chegávamos ao Castelinho, me dei conta de que não tinha visto ninguém na água, desde o Leblon. Associei o fato à notícia das algas.



Prestei atenção que Copacabana também não tinha nenhum banhista dentro da água. Naquele momento, cristalizou-se no meu íntimo a gravidade da situação e o descaso da Administração Pública Municipal e Estadual (coloco as duas, pois cocô e lixo envolvem as duas administrações) com nossas riquezas naturais. Daí para redigir o texto foi um pulo.



MARACANÃ

É noite de lua cheia, que ilumina com seus raios prateados a espuma branca das águas do Arpoador. A Piscininha demonstrou ser o local ideal para realização daquela reunião pois, estando localizada após o Pontão e o Salseiro, cercada pelo oceano e pelo paredão de rocha milenar, assim impedia o acesso de pessoas indesejáveis.



A reunião teve como objetivo a escolha do advogado que iria defender as algas marinhas, no JULGAMENTO que ocorreria no dia seguinte, pois ela estava sendo culpabilizada pelo Ministério Público de gerar as manchas gordurosas que invadem as praias do Rio de Janeiro - Cidade Maravilhosa.

Casais envolvidos em beijos e amassos, para os lados do Samarangue e da Praia do Diabo, nem desconfiavam da importância do que estava sendo decidido na Piscininha.

Ao final da reunião, que transcorreu com extrema eficiência, foi escolhido o advogado: O Tubarão. Os diversos grupos distribuíram então as respectivas tarefas para a batalha que se aproximava.

Amanhece o dia, ensolarado, emoldurando assim o cenário para a disputa daquela tarde.

Maracanã lotado !



A torcida da Natureza fechou o anel das arquibancadas com suas diversas facções, formadas por cardumes de badejos, tainhas, chernes, etc...

Na Rua Mata Machado trava-se uma briga generalizada, na qual as tartarugas enfiaram a porrada num grupo de cambistas, que tentavam vender ingressos falsificados.

Como sempre atrasadas, chegam ao estádio as diversas autoridades que, obviamente, torcerão pela condenação da ré, ocupando seus lugares na Tribuna de Honra; ali está representado o Poder Executivo, do prefeito ao presidente, como também o Poder Legislativo, com vereadores, deputados e senadores.

A vaia é geral!

No centro do campo, o Poder Judiciário ocupa o seu lugar, representado pelo digníssimo Ministro da Justiça que, imediatamente, convoca os responsáveis pela Acusação para ler o respectivo processo !

Assim é feito, e a inofensiva alga ouve todos os itens do Código Penal a que está sendo acusada por gerar e distribuir, senão até mesmo traficar e exportar, a mancha gordurosa nas praias do Rio de Janeiro, podendo vir a pegar 200 anos de reclusão, em regime fechado, na Penitenciária de Bangu 15.

Neste momento, adentra ao gramado o advogado da alga, sob aplauso de toda a galera, para expor sua bem redigida defesa.

A primeira surpresa é que o Tubarão vem nu, sem togas e chapéus, já que não precisa de elementos artificiais para esconder-se. A Polícia Militar invade o gramado, para punir aquele atentado ao pudor, pois se nem topless pode, como é que aquele elemento tem a petulância de comparecer a um Julgamento do Ministério Público, nu.

Entretanto, num instante de inteligência, o Presidente da República permite que o Tubarão participe como advogado de defesa da alga, desde que as câmeras não focalizem sua genitália.

Com esta decisão, a torcida inicia sua festa, pois ali percebeu que a vitória estava a caminho. Seguiram-se olas e, em vôos rasantes, os alegres pelicanos e gaivotas faziam demonstrações sobre o estádio.

O Tubarão faz a série de perguntas à ré;

- Alga, foi você que ao longo de 500 anos despejou esgoto não-tratado na Lagoa Rodrigo de Freitas, na Baía de Guanabara, e nas praias de Ramos, Flamengo, Icaraí, Botafogo, Urca, Copacabana, Ipanema e Leblon?

- Não, respondeu a ré.

- Alga, foi você quem instalou línguas negras nas areias das praias ?

- Não, mais uma vez respondeu a ré.

- Alga, foi você quem instalou o interceptor oceânico de Ipanema, jogando assim esgoto não-tratado a alguns metros da praia ?

- Não, disse a ré.

- Alga, foi você que ficou assistindo ao longo destes 500 anos, o lançamento destes dejetos na Natureza ?

- Sim, respondeu, de forma encabulada, a alga.

- Alga, mas você tinha algum poder para impedir ?

- Não, concluiu a alga.

E neste momento, voltando-se para a Tribuna de Honra do estádio, o nobre advogado de defesa discursa para os homens ali sentados, percebendo que já havia ganho a causa em questão:

- Senhores, caiam na real !

- Senhores, assumam que erraram ao longo de 500 anos, e iniciem um processo de tratamento dos seus dejetos!

- Senhores, tenham honestidade de propósito em assumir seus erros, e iniciem Planos de Recuperação e Tratamento!

- Senhores, elevem a Ética ao seu nobre posto, entre si e com a Mãe-Natureza!

A vitória foi geral !



Em seguida, em mais um rasante do grupo de alegres pelicanos e gaivotas, eles devolvem aos Poderes Públicos uma parte do que o homem lhes presenteia diariamente, em suas línguas negras e interceptores oceânicos .

No meio da confusão, junto à estátua do Belini, pivetes faziam um arrastão no cardume de botos, enquanto alguns políticos foram rechaçados, pois tentavam associar-se ao grupo vencedor, escolhendo o cardume de robalos; os peixes ficaram com medo !

A comemoração estava liberada, sendo que viola e sua turma seguiram pelo Boulevard 28 de Setembro para comemorar com Noel, cavaquinha e sua patota foram para a Lapa encontrar Ciro, os siris dirigiram-se para a Ilha do Governador e os tatuís retornaram para sua sede no Jangadeiros, em Ipanema, cantar a vitória com Elizeth e a banda local.

E quem proclamou a absolvição da ré foi o Cristo Redentor que, do alto do Corcovado, batia palmas em favor da Natureza!


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